sábado, 25 de fevereiro de 2012

CUIDADO COM OS BURROS MOTIVADOS

CUIDADO COM OS BURROS MOTIVADOS
 
 (Entrevista com Roberto Shinyashiki)
 
A revista ISTO É publicou esta entrevista de Camilo Vannuchi. O entrevistado é Roberto Shinyashiki, médico psiquiatra, com Pós-Graduação em administração de empresas pela USP, consultor organizacional e conferencista de renome nacional e internacional.
Em 'Heróis de Verdade', o escritor combate a supervalorização das aparências, diz que falta ao Brasil competência, e não auto-estima.
 
ISTO É - Quem são os heróis de verdade?
Roberto Shinyashiki -- Nossa sociedade ensina que, para ser uma pessoa de sucesso, você precisa ser diretor de uma multinacional, ter  carro importado, viajar de primeira classe.
O mundo define que poucas pessoas deram certo.
Isso é uma loucura. Para cada diretor de empresa, há milhares de funcionários que não chegaram a ser gerentes.
E essas pessoas são tratadas como uma multidão de fracassados.
Quando olha para a própria vida, a maioria se convence de que não valeu à pena, porque não conseguiu ter o carro, nem a casa maravilhosa.
Para mim, é importante que o filho da moça que trabalha na minha casa, possa se orgulhar da mãe.
O mundo precisa de pessoas mais simples e transparentes.
Heróis de verdade são aqueles que trabalham para realizar seus projetos de vida, e não para impressionar os outros.
São pessoas que sabem pedir desculpas e admitiram que erraram.


ISTO É -O Sr. citaria exemplos?
Shinyashiki --  Quando eu nasci, minha mãe era empregada doméstica e meu pai, órfão aos sete anos, empregado em uma farmácia.
Morávamos em um bairro miserável em São Vicente (SP) chamado Vila Margarida. Eles são meus heróis.
Conseguiram criar seus quatro filhos, que hoje estão bem.
Acho lindo  quando o Cafu põe uma camisa em que está escrito '100% Jardim Irene'.
É pena que a maior parte das pessoas esconda suas raízes.
O resultado é um mundo vítima da depressão, doença que acomete hoje 10% da população americana.
Em países como o Japão, a Suécia e a Noruega, há mais suicídio do que homicídio.
Por que tanta gente se mata?
Parte da culpa está na depressão das aparências, que acomete a mulher, que embora não ame mais o marido, mantém o casamento, ou o homem que passa  décadas em um emprego, que não o faz se sentir realizado, mas o faz se sentir seguro.


ISTO É -- Qual o resultado disso?
Shinyashiki -- Paranóia e depressão cada vez mais precoce.
O pai quer preparar o filho para o futuro e mete o menino em aulas de inglês, informática e mandarim. Aos nove ou dez anos a depressão  aparece.
A única coisa que prepara uma criança para o futuro, é ela poder ser criança.
Com a desculpa de prepará-los para o futuro, os malucos dos pais estão roubando a infância dos filhos.. Essas crianças  serão adultos inseguros e terão discursos hipócritas.
Aliás, a hipocrisia já predomina no mundo corporativo.


ISTO É - Por quê?
Shinyashiki -- O mundo corporativo virou um mundo de faz-de-conta, a começar pelo processo de recrutamento.
É contratado o sujeito com mais marketing pessoal.
As corporações valorizam mais a auto-estima do que a competência.
Sou presidente da Editora Gente e entrevistei uma moça que respondia todas as minhas perguntas com uma ou duas  palavras.
Disse que ela não parecia demonstrar interesse.
Ela me respondeu estar muito interessada, mas como falava pouco, pediu que eu pesasse o desempenho dela, e não a conversa. Até porque ela era candidata a um   emprego na contabilidade, e não de relações públicas.
Contratei-a na hora.
Num processo clássico de seleção, ela não passaria da primeira etapa.


ISTO É - Há um script estabelecido?
Shinyashiki -- Sim. Quer ver uma pergunta estúpida feita por um  presidente de multinacional no programa 'O Aprendiz'?
- Qual é seu defeito?
Todos respondem que o defeito é não pensar na vida pessoal:
- Eu mergulho de cabeça na empresa. Preciso aprender a relaxar.
É exatamente o que o Chefe quer escutar.
Por que você acha que nunca alguém respondeu ser desorganizado ou esquecido?
É contratado quem é bom em conversar, em fingir.
Da mesma forma, na maioria das vezes, são promovidos aqueles que fazem o jogo do poder.
O vice-presidente de uma as maiores empresas do planeta me disse:
'Sabe, Roberto, ninguém chega à vice-presidência sem mentir'.
Isso significa que quem fala a verdade não chega a diretor!


ISTO É - Temos um modelo de gestão  que premia pessoas mal preparadas?
Shinyashiki -Ele cria pessoas arrogantes, que não têm a humildade  de se preparar, que não têm capacidade de ler um livro até o fim e  não se preocupam com o conhecimento.
Muitas equipes precisam de motivação, mas o maior problema no Brasil é competência.
Cuidado com os burros motivados.
Há muita gente motivada fazendo besteira.
Não adianta você assumir uma função, para a qual não está preparado.
Fui cirurgião e me orgulho de nunca um paciente ter morrido na minha mão.
Mas tenho a humildade de reconhecer que isso nunca aconteceu graças a meus chefes, que foram sábios em não me dar um caso, para o qual eu não estava preparado.
Hoje, o garoto sai da faculdade achando que sabe fazer uma neurocirurgia.
O Brasil se tornou incompetente e não acordou para isso.


ISTO É - Está sobrando auto-estima?
Shinyashiki - Falta às pessoas a verdadeira auto-estima.
Se eu preciso que os outros digam que sou o melhor, minha auto-estima está baixa.
Antes, o ter conseguia substituir o ser.
O cara mal-educado  dava uma gorjeta alta para conquistar o respeito do garçom.
Hoje, como as pessoas não conseguem nem ser, nem ter, o objetivo de vida se tornou parecer.
As pessoas parecem que sabem, parece que fazem, parece que acreditam. 
E poucos são  humildes para confessar que não sabem.
Há muitas mulheres solitárias no Brasil, que preferem dizer que é melhor assim.
Embora a auto-estima esteja baixa, fazem pose de que está tudo bem.


ISTO É -Por que nos deixamos levar por essa necessidade de sermos perfeitos em tudo e de valorizar a aparência?
Shinyashiki -Isso vem do vazio que sentimos.
A gente continua  valorizando os heróis.
Quem vai salvar o Brasil? O Lula.
Quem vai  salvar o time? O técnico.
Quem vai salvar meu casamento? O terapeuta.
O problema é que eles não vão salvar nada!
Tive um professor de filosofia que dizia:
'Quando você quiser entender a essência do ser
humano, imagine a rainha Elizabeth com uma crise de diarréia durante um jantar no Palácio de Buckingham'. Pode parecer incrível, mas a  rainha Elizabeth também tem diarréia.
Ela certamente já teve dor de dente, já chorou de tristeza, já fez coisas que não deram certo.
A gente tem de parar de procurar super-heróis, porque se o super-herói não segura a onda, todo mundo o considera um fracassado.


ISTO É - O conceito muda quando a expectativa não se comprova?
Shinyashiki - Exatamente. A gente não é super-herói nem  superfracassado.
A gente acerta, erra, tem dias de alegria e dias de tristeza.
Não há nada de errado nisso.
Hoje, as pessoas estão questionando o Lula, em parte porque acreditavam que ele fosse mudar suas vidas e se decepcionaram.
A crise será positiva se elas entenderem que a responsabilidade pela própria vida é delas.


ISTO É - Muitas pessoas acham que é fácil para o Roberto Shinyashiki dizer essas coisas, já que ele é bem-sucedido. O senhor tem defeitos?
Shinyashiki -Tenho minhas angústias e inseguranças. Mas aceitá-las faz minha vida fluir facilmente.
Há várias coisas que eu queria e não consegui.
Jogar na Seleção Brasileira, tocar nos Beatles (risos). Meu filho mais velho nasceu com uma doença cerebral e hoje tem 25 anos.
Com uma criança especial, eu aprendi que,  ou eu a amo do jeito que ela é, ou vou massacrá-la o resto da vida para ser o filho que eu gostaria que  fosse.
Quando olho para trás, vejo que 60% das coisas que fiz deram certo.
O resto  foram apostas e erros.
Dia desses apostei na edição de um livro, que não deu certo.
Um amigão me perguntou:
'Quem decidiu publicar esse livro?'
Eu respondi que tinha sido eu. O erro foi meu. Não preciso mentir.


ISTO É - Como as pessoas podem se livrar dessa tirania da aparência?
Shinyashiki - O primeiro passo é pensar nas coisas que fazem as  pessoas cederem a essa tirania e tentar evitá-las.
São três fraquezas:
A primeira é precisar de aplauso, a segunda é precisar se sentir amada e a terceira é buscar segurança.
Os Beatles foram  recusados por gravadoras e nem por isso desistiram.
Hoje, o erro das escolas de música é definir o estilo do aluno.
Elas ensinam a tocar como o Steve Vai, o B. B. King ou o Keith Richards.
Os MBAs têm o mesmo problema: ensinam os alunos a serem covers do Bill Gates.
O que as escolas deveriam fazer é ajudar o aluno a desenvolver suas próprias potencialidades.


ISTO É - Muitas pessoas têm buscado sonhos que não são seus?
Shinyashiki - A sociedade quer definir o que é certo. São quatro  loucuras da sociedade...
A primeira é instituir que todos têm de ter sucesso, como se eles não tivessem significados individuais.
A segunda loucura é:
Você tem de estar feliz todos os dias.
A terceira é:
Você tem que comprar tudo o que puder. O resultado é esse consumismo absurdo.
Por fim, a quarta loucura:
Você tem de fazer as coisas do jeito certo. 
Jeito certo não existe.
Não há um caminho único para se fazer as coisas.
As metas são interessantes para o sucesso, mas não para a felicidade.
Felicidade  não é uma meta, mas um estado de espírito.
Tem gente que diz que não será feliz, enquanto não casar, enquanto outros se dizem infelizes justamente por causa do casamento.
Você pode ser feliz tomando sorvete, ficando em casa com a família ou com amigos verdadeiros, levando os filhos para brincar ou  indo à praia ou ao cinema.. 
Quando era recém-formado em São Paulo , trabalhei em um hospital de pacientes terminais.
Todos os dias morriam nove ou dez pacientes.
Eu sempre procurei conversar com eles na hora da morte.
A maior parte pega o médico pela camisa e diz:
'Doutor, não me deixe morrer. Eu me sacrifiquei à vida inteira, agora  eu quero aproveitá-la e ser feliz'.
Eu sentia uma dor enorme por não poder fazer nada. Ali eu aprendi que a felicidade é feita de coisas pequenas.
Ninguém na hora da morte diz se arrepender por não ter aplicado o dinheiro em imóveis ou ações, mas sim de ter esperado  muito tempo ou perdido várias oportunidades para aproveitar a vida.



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Rubem Alves - O papel do professor

Um convite à reflexão sobre ética, interesse público, políticas públicas etc.

Um convite à reflexão sobre ética, interesse público, políticas públicas etc.

Quando nascemos, uma série de princípios e valores nos é transmitida. Não de modo imediato, obviamente, mas através de nossa criação. Dia após dia o convívio nos mostra uma nova faceta da vida. Cada passo nos revela uma verdade e, por consequência, uma possível mentira. O certo está de um lado, enquanto o errado é o extremo oposto. Se levarmos essa máxima ao mais alto de nossa consciência, teremos como exato que não há meio termo, há, isto sim, o certo e o errado. Certo? Errado! Há sim o meio termo, do contrário, daremos margem à intolerância!
Nas ciências jurídicas, ao estudarmos a competência discricionária do Estado, aprendemos que esta se impõe a situações que dependem de uma avaliação do caso concreto, pois o legislador não tem meios de vislumbrar tudo que possa acontecer no convívio social. Não é um juízo de certo ou errado, mas uma avaliação do que é adequado. Nas lições dos mais brilhantes administrativistas brasileiros, compreendemos que o cotidiano de um administrador público se revela, sobretudo, como a arte da escolha entre alguns caminhos possíveis e corretos. Em outras palavras, dentro do “certo” há muitas possibilidades, por mais que em determinadas situações apenas uma seja a aceitável e deva ser necessariamente seguida.
Não quero aqui inaugurar um estudo acerca desse ramo tão belo do Direito, o Direito Administrativo. Ao contrário, quero trazer os exemplos acadêmicos à vida de cada um de nós. Quero demonstrar que a vida também nos dá algumas possibilidades frente à situação vivida. Há aquelas que, de longe, são inaceitáveis, pois ferem os princípios e valores que nos foram transmitidos. Podem até ser certas para aqueles que contam com um respaldo axiológico diverso, mas certamente não serão para todos nós. Há outras que são inadmissíveis a quem quer que seja, pois fogem ao ideal do que seja verdadeiramente humano.
No Direito Administrativo, assim como na vida, nossas atitudes tem que contar com um objetivo que reflete nossa “função social” neste mundo. O alvo é o bem coletivo e, o bem dos outros, ao menos através de nossas ações, consubstancia-se em não ignorarmos o “alheio”, isto é, em, não prejudicarmos o próximo e, na máxima medida possível, realizarmos também o bem do outro. Qualquer escolha pessoal deve ser censurada se nela estiver contida o mal do alheio. Isso tem uma razão metareligiosa, trata-se do dever de nos comportarmos sem prejuízo de quem quer que seja. Do contrário, nossa trajetória nesta vida não é a construção de um mundo melhor, mas sim a destruição de todos, incluindo-nos nesse catastrófico resultado. Quando destruo o outro, destruo a mim mesmo!
Assim, todos aqueles que puderam contar com o amor de pai e mãe, todos que viveram uma realidade de amor, sabem que o caminho a ser percorrido, mais do que o bem comum, é a ausência do mal alheio. Aliás, o mal alheio é, sem dúvida, um dos motivos que levam o direito penal a criminalizar uma série de condutas. Nessa esfera do Direito condena-se não só aquilo que faz mal ao alheio, subjetivamente considerado, mas às diversas esferas do Estado, isto é, à Ordem Econômica, à Administração da Justiça etc. Também por isso cada tipo penal visa tutelar mais de um bem jurídico. Quando infrinjo a ordem econômica não o faço apenas contra o Estado, pois se este é o realizador (ou deveria ser!) de uma série de políticas públicas, acabo por afetar esse segundo objetivo, fraudo o erário. Ainda que na conduta não exista essa finalidade, o resultado é inevitável.
Abrir os jornais e contemplar um esquema de corrupção envolvendo a merenda escolar é um exemplo disso. Há humanos que pretendem lucrar criando prejuízos ao Estado e enriquecendo-se, ilicitamente, com os recursos que deveriam seguir a um fundo mais do que nobre, qual seja, a merenda escolar. Trata-se de propiciar ao pequeno aluno da educação infantil condições de absorver tudo que lhe é passado. Meu avô, delegado de ensino, repetia inúmeras vezes a frase: “para educar as crianças é preciso torná-la felizes”! Fosse essa a realidade e as coisas estariam mais simples! Atualmente, tiram das crianças a chance de se alimentarem para conseguirem aprender o que lhes ensinam seu mestres. Estudar sem ter o que comer é uma das mais absurdas situações! Em suma, retrocedemos!
Os leitores podem indagar: mas esse escritor inicia um texto falando da possibilidade de existir algo entre o “certo e o errado” e se estende em uma avaliação política? Sim, é isso mesmo! Trata-se de perceber que o mundo piorou muito e a Administração Pública vai de mal a pior. Essas dramáticas constatações da política brasileira revelam a baixa presença da ética nos lares nacionais. Notem, se alguém rouba o dinheiro da merenda escolar, esse mesmo alguém não teve qualquer noção de certo e errado em casa. Pior, as crianças prejudicadas, quando atingirem idade para compreenderem o tamanho dessa indignidade, saberão que aqueles que regem a coisa pública jamais se preocuparam com suas necessidades. Assim, por que deveriam comportar-se eticamente na vida que iniciarão?
Tive o privilégio de ser aluno de um jurista que recobre com ética cada uma de suas aulas. O Desembargador José Renato Nalini, cujo livro consulto com alguma frequência, ensina esse tipo de coisa que deveria ser elementar, mas, infelizmente, perdeu-se em objetivos econômicos que mercantilizam absolutamente tudo! Àqueles que se cansam de tanta balbúrdia na política e na vida, aconselho, desta “ilha dos sonhadores”, a obra “Ética geral e profissional” (Revista dos Tribunais), pois lá, assim como eu, encontrarão um consolo. Contemplarão a existência de inúmeras laudas que relembram os mais elementares princípios éticos que não são observados na vida do homem público e, no mais das vezes, encontram o silêncio na vida do homem comum, isto é, na minha, na sua, na de nossas famílias.
Quantos políticos repetem em suas campanhas, de forma estéril, a importância da educação? São muitos dos quais permitiram em seus governos inúmeras fraudes envolvendo a merenda escolar. Senhores que acreditam ser possível o aprendizado de estômago vazio, ou que se valem desse dever para o enriquecimento ilícito! “Lídimos” políticos que se esmeram com a promoção pessoal e se olvidam do que há de realmente público em suas funções. A crise ética se apresenta flagrante nesses atos de improbidade que se desvirtuam não só do justamente almejado, mas sobretudo do humano! Quem tira comida de crianças ou ganha ilicitamente com isso não merece piedade! Merece, isto sim, as “duras” imposições legais!
Em face de tantos caminhos tortuosos, advindos de atos perpetrados por aqueles que deveriam tutelar o bem comum, há uma instituição que ganhou inegável reforço na Constituição Cidadã (CF/88). O Ministério Público, composto por inúmeros indivíduos voltados aos princípios que materializam a dignidade da pessoa humana, preocupa-se e está legitimado a impugnar atos de tamanha vileza. Esse promotores de justiça são um reduto de esperança na construção de uma sociedade livre, justa e solidária! Cientes do “poder-dever” que têm nas mãos, atuam de maneira irrepreensível em face desses desvios imperdoáveis. Atuam como verdadeiros defensores do bem comum! Levam à apreciação do Judiciário as atrocidades que nossos irmãos praticam no trato da coisa pública (res publica). São um “porto seguro” de inúmeros indivíduos prejudicados com práticas que ferem a probidade, a justiça a noção mais elementar de humanidade!
Ressalte-se, ainda, que a dita discricionariedade administrativa, como acima elucidado, não é ilimitada. O Administrador Público não tem a possibilidade de fazer o que quiser, pois nosso ordenamento prevê a revisão judicial de todo ato que lese ou ameace qualquer direito. Nesse contexto, a possibilidade de revisão judicial de políticas públicas não fere qualquer divisão de poderes, mas, ao contrário, viabiliza a avaliação da atitude de nossos governantes em face dos princípios regedores de nosso Estado. Os estudos a respeito dessa questão são longos. Diversos juristas se debruçaram sobre a questão e a matéria merece acompanhamento na doutrina acerca do tema, não sendo possível abordar cada uma das respeitosas posições.
Nestas breves linhas, resta consignar que, seguindo as palavras com que iniciei este texto, temos diversas possibilidades dentre as “corretas”, mas, jamais, o Administrador Público (gestor de coisa alheia por natureza) terá deferida a possibilidade de fazer o “errado”, isto é, realizar qualquer ação contrária ao que determinado em nosso ordenamento jurídico. Para isso existe uma lei de improbidade administrativa e diversas outras que tutelam o bem coletivo. Administrador é mandatário e, como tal, deve prestar contas à população! Administrar é “executar a lei de ofício”, de sorte que se desvirtuar dos objetivos legais é vedado. Se realizar o mal do outro é vedado por decência, o que dizer do mal público/coletivo perpetrado por indivíduos investidos em mandato popular? Estes deveriam ler, ainda que brevemente, “República e Constituição” (Malheiros Editores), de autoria de Geraldo Ataliba, a fim de vislumbrarem a magnitude de seus “deveres-poderes”. Todas as palavras revelam que mais do que uma questão política, estamos enfrentando a falta de HUMANIDADE em todas as esferas da vida HUMANA!
*Luiz Fernando de Camargo Prudente do Amaral é advogado, mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Magistratura. Autor da obra “A função social da empresa no Direito Constitucional Econômico Brasileiro” e de artigos jurídicos. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e à Associação Nacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Pós-Graduação.

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO COMBATE A DESERTIFICAÇÃO NO NORDESTE

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: POLÍTICAS PÚBLICAS E EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO COMBATE A DESERTIFICAÇÃO NO NORDESTE

Jailton Macena Araujo, Danilo Barbosa Arruda

Resumo


Inquestionável é o processo de devastação da natureza e seus ecossistemas pelas ações antropológicas, de tal maneira que o processo de desertificação cresce vertiginosamente. É imperioso, portanto, que deve ser controlado e seus efeitos mitigados através de políticas públicas comprometidas com o desenvolvimento sustentável e com a conscientização popular pela educação ambiental. Interferência do ordenamento jurídico por meio do Direito Ambiental e mecanismos institucionais para combate a desertificação, que representam instrumento de desenvolvimento e geração de oportunidades sociais.

Palavras-chave


Desertificação; Políticas públicas; Meio ambiente saudável; Desenvolvimento sustentável.
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http://www.fit.br/home/link/texto/politicas_publicas.pdf
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A melhor escola do mundo Como a Finlândia criou, com medidas simples e focadas no professor, no professor, o mais invejado sistema educacional.

Políticas Públicas de Educação - Simon Schwartzman

Políticas Públicas de Educação
Simon Schwartzman
Comentário aos textos de Divonzir Artur Gusso, "Apreciação de Políticas Públicas: Uma Experiência no Âmbito Governamental", e José Amaral Sobrinho, "Políticas Públicas de Educação Básica: Algumas Reflexões", apresentado ao "Seminário Interinstitucional para a Avaliação de Políticas Públicas de Educação - Estudos e Metodologias", Belo Horizonte, Fundação João Pinheiro, 20 a 23 de novembro de 1990.

A leitura dos textos de Divonzir Gusso e José Amaral Sobrinho deixa a impressão de que evoluímos de um tempo em que políticas públicas eram formuladas e acompanhadas de forma explícita, e havia otimismo sobre o que governos podiam fazer, para a situação atual, em que as políticas são muito mais difusas ou mesmo inexistentes. Hoje sabemos muito mais sobre a natureza e os limites da administração pública, em termos gerais e no Brasil em particular, assim como sobre suas relações complexas com o sistema político e a cultura do país. O resultado desta maior sabedoria, no entanto, não tem sido melhorar a capacidade governamental em formular políticas e levá-las à cabo, mas um grande ceticismo a respeito do que o possa ser feito; ceticismo reforçado pelas experiências frustrantes do governo Sarney, às quais se somam os ataques generalizados ao Estado que fazem parte da ideologia dominante destes últimos anos.

Esta impressão geral deve ser vista à luz de três fatos importantes: primeiro, as políticas educacionais do período mais "otimista" (que foi o período do milagre econômico, do autoritarismo e da centralização político-administrativa do país) eram no melhor dos casos ingênuas em sua onipotência, e, em geral, não foram bem sucedidas, ainda que faltem padrões claros para sua avaliação (o Mobral talvez seja o maior exemplo de um projeto ambicioso que se frustrou). A esta observação deve-se acrescentar uma segunda, que é a que fracassos em política educacional ocorrem mesmo em situações de abundância financeira, como parece estar ocorrendo hoje na periferia das grandes cidades dos Estados Unidos. Estas duas constatações poderiam nos levar à conclusão de que políticas educacionais são impossíveis, e deixar-nos sem nada nas mãos, não fosse um terceiro fato importante: é que muitos países conseguiram resolver de forma bastante satisfatória seus problemas de educação básica, mesmo em condições econômicas piores do que as nossas. Isto significa que, mesmo que não saibamos como, é possível ter uma política educacional razoável, e que dê resultados satisfatórios. A grande questão é: o que é que explica a diferença?

Eu gostaria de sugerir que a variável básica que explica o sucesso ou fracasso das políticas educacionais é a motivação das pessoas. Em algumas sociedades, em algumas épocas históricas, as pessoas se convencem de que educar-se é uma coisa importante, boa para elas e para seus filhos, e é em cima desta matéria prima que os sistemas educacionais se constroem. A importância da motivação fica clara quando nos lembramos de algumas teorias que buscavam explicar as dificuldades da educação básica brasileira pelas diferenças lingüísticas entre os professores de classe média e alunos das camadas sociais menos favorecidas. Dificilmente haveriam barreiras lingüísticas mais fortes do que as que afetam os filhos de imigrantes japoneses, por exemplo, cuja motivação em estudar e aprender é no entanto conhecida, e que normalmente apresentam excelente desempenho escolar.

Em muitas sociedades, a busca da educação faz parte de tradições culturais e mesmo religiosas de suas populações. A educação religiosa judáica, por exemplo, requer a leitura da Bíblia na língua original, o que elimina de saída o analfabetismo, e levou inclusive ao uso de caracteres hebraicos para o registro de idiomas ocidentais como o ídiche e o ladino, como alternativas à falta de acesso às línguas cultas locais. Esta tradição de leitura foi incorporada pelas religiões protestantes da Europa Ocidental, aonde se somaram aos movimentos de identidade cultural e nacional, que freqüentemente se expressavam em termos da defesa dos direitos de preservação e cultivo da língua materna. As questões educacionais sempre estiveram associadas aos conflitos étnicos e religiosos no continente europeu, e os sistemas nacionais de educação que se estabeleceram na maioria daqueles países ao longo do século XIX, tiveram sempre que negociar e administrar as pressões e demandas por educação que vinham de baixo para cima. O professorado, nestes países, surgia quase sempre dos quadros religiosos, um fenômeno que ainda hoje observamos entre a população negra nos Estados Unidos. Quando olhamos a história desta perspectiva, percebemos como é falsa a idéia de que a educação universal tenha se desenvolvido em função das necessidades do capitalismo. Ao contrário, o que parece ter ocorrido é que o capitalismo moderno só teve condições de se desenvolver efetivamente em sociedades previamente educadas.

A França talvez seja o único exemplo, na Europa, de um sistema educacional que se desenvolveu de cima para baixo, através de uma administração centralizada, e de um projeto educacional que se identificava com o projeto de construção de uma cidadania. Mais tarde o exemplo francês foi mais ou menos copiado por muitos outros países, como na América Latina onde, em geral, fracassou ou nos países socialistas, onde parece ter apresentado resultados mais interessantes.

De fato, se os regimes socialistas foram um fracasso econômico e político, eles certamente sucederam no campo da educação. Com raras exceções, os países socialistas conseguiram pouco em termos de pesquisa científica e tecnológica, e suas universidades são sofríveis; mas a educação secundária tende a ser geral, e de uma qualidade que não fica a dever, e muitas vezes supera, a dos países ocidentais. Como explicar este desempenho?

Creio que existem dois fatores. O primeiro é que, nos seus melhores dias, os regimes socialistas foram capazes de mobilizar e galvanizar o apoio de suas populações, e desta forma infundir a motivação pela educação, sem a qual os projetos educacionais fracassam. A segunda que vale também para a França foi a criação de um corpo de professores leigos prestigiado e motivado, que fazia da função educativa uma tarefa importante e valorizada. Existe ainda um terceiro fator, naturalmente, que foi a decisão política de investir recursos importantes para a educação, mas este fator pode pouco sem os demais.

Se esta análise é correta (e não há dúvida que ela representa uma grande simplificação de uma história muito mais complexa), o que ela nos ensina a respeito das possibilidades e limites da política educacional brasileira?

A primeira questão é saber se existe entre nós motivação para a educação. No pior extremo, o Brasil possui um grande hard-core de pessoas altamente resistentes à educação, e que dificilmente responderão a uma política oficial de desenvolvimento educacional, seja ela qual for. São os analfabetos das regiões mais atrasadas do país, pessoas que nasceram ou foram jogadas desde cedo na marginalidade urbana, que não possuem uma estrutura familiar constituída. Em muitos aspectos, elas se assemelham ao hard-core não educável dos Estados Unidos, só que em proporção muito maior. Estas pessoas necessitam menos de educação formal do que de um trabalho complexo e difícil para trazê-las para dentro de uma sociedade que, por razões conhecidas ou não, tende a excluí-las. É um trabalho que requer o envolvimento de grupos sociais organizados, movimentos religiosos, associações locais, partidos políticos de base popular. A melhor política educacional para estes grupos parece ser a de apoiar estes movimentos de baixo para cima, facilitando seu trabalho, dando incentivos, e não pretendendo controlá-los ou regulá-los de cima para baixo. Não se pode esperar resultados espetaculares - a erradicação do analfabetismo, no Brasil, é um projeto de muitas décadas mas pode haver progresso.

Mas, ao mesmo tempo, os dados do PNAD que têm sido analisados por Sérgio Costa Ribeiro mostram um quadro radicalmente distinto. 95% das pessoas passam hoje pelo sistema educacional, e ficam em média 8,5 anos na escola, ainda que só consigam cursar, também em média, até a 5 série. O que não sabemos com certeza é a natureza exata desta tenacidade. A educação formal é hoje uma atividade em grande parte burocrática, um ritual que quando cumprido cria a expectativa de certos direitos e benefícios, que independem do conteúdo aprendido. A atitude ritualista não é só de parte dos estudantes, mas freqüentemente também de parte dos professores e demais autoridades escolares, para os quais "cumprir o programa" é muitas vezes o único sentido de sua atividade pedagógica.

O problema central da educação brasileira hoje é como transformar esta motivação em um esforço educativo real e de qualidade. Isto significa, essencialmente, devolver a iniciativa para o nível em que esta motivação se dá, o que significa a escola, o professorado e as famílias dos estudantes.

A experiência internacional mostra que a educação dá certo quando as famílias se envolvem com a educação dos filhos. Um requisito para isto, que quase não existe nos setores mais pobres no Brasil, é que os pais, e principalmente as mães, tenham sido educadas, e possam transmitir suas experiências e interesses aos filhos. Quando isto não ocorre, ainda assim é importante tratar de envolver as famílias nas atividades das escolas, fazendo com que elas se sintam parte e responsáveis pelo que ocorre no dia a dia da vida de seus filhos. Esta é uma tarefa difícil, e que se torna ainda mais grave entre nós porque o ensino público brasileiro tem sido sempre refratário ao envolvimento das escolas com as comunidades, para pedir ajuda, envolver os pais, fazer campanhas, promover mutirões. Um dos argumentos contra o maior envolvimento das comunidades com as escolas é que isto levaria a desigualdades, e acabaria gerando interferências leigas e indesejáveis no processo educativo. Argumentos como estes poderiam ser importantes, se a escola pública brasileira estivesse cumprindo o papel que dela se esperaria.

O segundo foco de motivação são as próprias escolas, freqüentemente dotadas de pessoas motivadas e interessadas no que fazem, e frustradas pela falta de condições e pelos entraves burocráticos e administrativos ao seu trabalho. A valorização e o apoio às lideranças das escolas requer uma forma de descentralização que ainda não foi tentada no Brasil, que não é a de transferir a autoridade educacional dos estados para os municípios, mas sim de transferir a autoridade diretamente para as escolas. É claro que uma política destas traz grandes riscos, mas eles não são maiores do que transferir a autoridade educacional para os prefeitos. E estes riscos deixam de ser importantes se a efetiva autonomização financeira e pedagógica das escolas vier associada a sistemas bastante claros de prêmios, incentivos e punições ao desempenho, associados a parâmetros pedagógicos bem definidos.

O terceiro aonde deve existir motivação é entre professores. É aqui, talvez, onde se requeira a perspectiva mais radical. Talvez não seja mais possível voltar aos tempos da professorinha que dedica a vida a seus alunos, ou ao professor de geografia ou matemática que passa a vida lidando com alunos adolescentes. A imprensa tem sido pródiga, recentemente, em notícias sobre o gradual desaparecimento da profissão de professor. Na maioria dos casos, e cada vez mais, as pessoas que permanecem nesta atividade o fazem por não conseguir ir adiante em seus projetos de vida, e não têm como transmitir aos jovens um envolvimento sincero e genuíno com os conteúdos de suas disciplinas. Talvez tenha chegado o tempo de admitir que a atividade de ensino de primeiro e segundo graus deve ser vista como um momento passageiro na vida das pessoas, enquanto estudam nas universidades, ou enquanto fazem o serviço militar, ou quem sabe quando se aposentam. A combinação de uma liderança profissional altamente qualificada e motivada, e jovens estudantes e profissionais em início de carreira que se dedicam ao ensino básico e secundário como primeira etapa em suas vidas de trabalho talvez seja um cenário mais promissor do que a esperança de devolver ao professorado o prestígio e a remuneração que tinham quando o ensino secundário público era ainda elitizado, e as universidades praticamente não existiam.

Um quarto lugar aonde deve, ou deveria, existir motivação é nas universidades. Haviam em 1988 cerca de 122 mil alunos de pedagogia em todo o Brasil, a quarta carreira mais procurada, depois de administração, direito e engenharia. No entanto, é difícil afirmar que toda esta massa de estudantes vai efetivamente se dedicar ao ensino. Na realidade o que estas pessoas aprendem são os aspectos assessórios e externos da atividade educacional, que em muitos casos são buscadas como forma de especialização para fugir das atividades menos valorizadas do magistério. A dissociação entre os conteúdos educacionais e a formação pedagógica é um problema da maior seriedade no sistema de ensino superior brasileiro, que acaba fazendo com que as pessoas mais competentes e motivadas voltem as costas às atividades do ensino. Deve ser possível, no entanto, trazer de volta a educação básica para o centro de preocupação das universidades brasileiras, não só nas faculdades de educação, mas sobretudo nos institutos e departamentos de ciências e humanidades.

Eu resumiria meus comentários dizendo que a experiência brasileira, quando posta em uma perspectiva comparada mais ampla, sugere que o único caminho possível para uma política educacional para o país parece estar na descentralização radical da execução das tarefas educativas, para os grupos e setores sociais que possam ser motivados a assumir este trabalho, restando aos governos centrais as tarefas imprescindíveis do estímulo, acompanhamento, financiamento, definição de padrões e avaliação. A outra conclusão é que as profundas desigualdades sociais e culturais que o Brasil apresenta não poderão ser corrigidas somente pela educação, e que, enquanto estas desigualdades não se reduzirem, teremos que continuar a conviver com um sistema educacional também estratificado, onde o que cabe fazer é tratar de atender a cada qual naquilo quer tenha condições de receber.